segunda-feira, 9 de julho de 2012


Tiago Patrício
Jovem escritor Moncorvense ganhou o Prémio Revelação Agustina Bessa-Luís 2011
Entrevista no Correio da Manhã:

 
 
Tiago Patrício: "Quero escrever um livro que possa oferecer a qualquer pessoa, sem distinção de idade, profissão ou credo religioso."




Tiago Patrício: “Este prémio foi um balão de oxigénio”
Jovem escritor ganhou o Prémio Revelação Agustina Bessa-Luís 2011, no valor pecuniário de 25 mil euros. Aos 33 anos, tanto escreve poesia como teatro ou romance.
Por:Ana Maria Ribeiro


Correio da Manhã - Quanto tempo trabalhou neste romance?
Tiago Patrício - Comecei a escrever ‘Trás-os-Montes' no final de Outubro de 2010, com o objectivo de concorrer ao prémio Agustina Bessa-Luís. Parti de um manuscrito escrito entre os 19 e os 22 anos com quase quatrocentas páginas mas depois achei melhor começar tudo de novo. Fiz uma pausa depois do Natal e voltei em Março. A versão final surgiu a 15 de Maio, depois de a minha mulher ter feito uma revisão exaustiva.
- Esta é a história ficcionada da sua própria infância?
- Vivi em Trás-os-Montes dos 9 meses aos 19 anos. Ainda é a minha casa. É ali, entre duas aldeias do concelho de Torre de Moncorvo, que estão as minhas referências. Mas a história das personagens não é a minha nem de ninguém. A própria aldeia, cujo nome nunca é mencionado, pode ser em Trás-os-Montes ou no Nordeste do Brasil.
- Há pessoas que se vão reconhecer nestas personagens?
- Qualquer pessoa pode reconhecer-se em qualquer personagem mas nenhuma estava definida à partida. Prefiro que tenham uma agenda própria. Mas posso dizer que há em todas elas fragmentos da minha memória.
- A descoberta da morte é a grande lição do protagonista...
- Os protagonistas do livro são crianças em fase de aprendizagem aguda. Apesar de tudo, as tradições têm uma razão de ser e precisamos de acreditar que a alma existe, que o divino nos habita e que podemos conhecer o Mundo para poder lidar com esta coisa bela e terrível que é estar vivo num tempo como este.
- Receber o prémio foi uma surpresa, um susto ou incentivo?
- Quando me ligaram a dar a notícia senti uma espécie de alívio. Sabia que o ano de 2012 ia ser difícil e o prémio era uma espécie de balão de oxigénio. Também tem grande peso institucional, o que cria uma enorme responsabilidade. O meu próximo romance terá de manter pelo menos o nível do primeiro.
- É um escritor de inspiração ou de disciplina?
- Quando tenho um compromisso para escrever, seja romance, poesia ou teatro, sou disciplinado e escrevo várias horas por dia. É a fase burocrática. Nos períodos criativos, escrevo quando tenho alguma coisa para dizer. Às vezes passam-se dias sem ter uma ideia digna de registo. Mas andar de bicicleta, passear, ir à natação e até lavar a loiça ajudam a resolver crises criativas.
- Como será o próximo romance?
- Sobre o Mar Báltico. Depois quero regressar a Trás-os-Montes para tentar escrever um romance onde o convívio em comunidade seja possível. Quero escrever um livro que possa oferecer a qualquer pessoa, sem distinção de idade, profissão ou credo religioso.

Prontos para mais uma vagueirada???


Para lêr ou relêr uma grande entrevista do grande Rui Lapa (Frágil)


UM PUNK FRÁGIL NUNCA MORRE

ENTREVISTA POR NUNO B. VIEIRA, FOTOGRAFIA POR NUNO MIRANDA
FOTOGRAFIAS DE ARQUIVO CEDIDAS POR FRÁGIL



Os anos 80 em foram uma década de impacto, de dúvidas, de grandes transformações sociais, de movimentos extremistas. Ainda cheio de borbulhas na cara, eu vivia a alguns quilómetros de distância do Porto, mas de lá chegavam histórias de gajos com cristas, de punks, rockabillies, skinheads e confrontos na rua. A cidade estava envolta numa atmosfera pós-revolução—que a minha tia apelidava de libertinagem—que se manifestava frequentemente em várias formas de expressão artística, desde a música aos primeiros graffitis. O encontro que tive com o Frágil—um dos primeiros punks do norte de Portugal, famoso pelas suas actuações como vocalista dos Renegados de Boliqueime—foi uma visita guiada, na primeira pessoa, à vida de um punk.

Vice: Bebes uma cerveja?
Frágil:
Não, obrigado. Estou proibido pelo médico, tenho diabetes. Agora sou straight edge. [risos]

Eu tenho algumas quebras de açúcar. Na volta sou diabético.Mijas muito?

Não.Então em princípio não se passa nada. Eu quando vi O Padrinho e aquelas cenas, pensei logo que tinha. Fui fazer exames e já estava em 600 e tal.

Estou assustado, vamos falar sobre outras coisas. Quando é que te sentiste punk?Talvez em 84, em Ku de Judas [banda portuguesa de punk-hardcore formada em 83]. É uma cena que te entra. Uma aura qualquer que acontece em ti, num concerto, e sentes que é aquilo.

Moravas em Trás-os-Montes. Sítio difícil para ser punk.Sim. Para ir ver concertos a Lisboa tinha que sair de Torre de Moncorvo às seis da tarde, para lá chegar às oito da manhã do dia seguinte. Mas havia bué de punk em Moncorvo—era Lisboa, Porto, Coimbra e Moncorvo. Lembro-me de ver Xutos em Mirandela. Fomos de boleia num carro mortuário. Depois, claro, fizemos merda no concerto. A vinda para Moncorvo foi a pé. Não nos davam boleia. Nós de moicano, o pessoal até acelerava. E aí conheci o gajo dos Hospital Psiquiátrico [banda de punk], o Paulo. Nós os dois de crista, sempre a discutir. Disse-me: “És punk? Eu sou mais punk.” E dá um murro no vidro das pautas e corta-se todo. Histórias de garoto. Não aguentávamos viver lá.

Lojas de discos, nada, como é óbvio.Nem lá, nem cá. Havia uma loja no Porto, mas não tinha discos de punk. Havia algumas coisas em Lisboa, mas muito pouco. Mas eu não tinha dinheiro para discos, era de uma família pobre. Nem Clash havia à venda. O primeiro disco que comprei foi um dos Ramones, o It’s Alive. Naquela altura, o que valia eram as fanzines. Havia uma muito boa no Porto, a Cadáver Esquisito.

E andar de crista em Moncorvo?O meu conceito de punk foi sempre muito nobre. Fui sempre honesto, nunca fui um gajo de drogas. Mas as pessoas achavam que sim. Acontece que, depois, os pais dos drogados viam-me sempre na boa e comecei a ganhar crédito. O choque maior era no Porto, a pior cidade para andar de visual. As pessoas aqui confrontavam-te, enquanto em Lisboa passavas por puto giro, dava pica. As pessoas tinham-te medo. Mas no Porto confrontam. Lembro-me de ter escrito Disorder atrás. Tirei logo. Passavam por mim e diziam: “Ó desordeiro, tens a mania. Queres levar um murro nos cornos?” Uma outra vez, vínhamos dois de moicano, num comboio em Famalicão, e começam a dizer alto: “Estes gajos das FP 25 deviam morrer todos, estes filhos da puta.”

Como é que foram as tuas primeiras experiências fora da vila?Com 17 anos peguei na mochila e lá vai ele. Meti-me num comboio, todo bêbado, e fui correr a Europa. Pouco depois estava em Paris, sozinho, de moicano no meio de milhões de pessoas. Tempos diferentes. Andar com um símbolo anarquista em Paris era fodido. Fui parar à esquadra por causa disso. Lá, disseram: “Anarquista, terrorista”. Eram outros tempos, havia cenas fodidas na época. O Erribatazuna estava no auge, havia muita cena na Alemanha, as brigadas vermelhas em Itália. Depois aquilo estagnou, ainda que estejam a voltar outra vez. Isto é por ciclos.

Como é que percebes esses movimentos?Em relação aos skinheads, eu acho que eles têm todo o direito de se manifestarem politicamente, como qualquer outro. Agora andarem por aí a guardar a cidade, como se fossem tropa, já não concordo. Sou anti-fascista até à morte. Durante anos, tive bué de problemas com a polícia por causa deles.

E nos teus concertos não apareciam skins?Apareciam. Mas há vários tipos. Vinham mais redskins. Ao longo de 30 anos há muitas histórias. Por exemplo, nos anos 80 era difícil lidar com os metaleiros.

Mas com os metaleiros não era tanto uma cena política!Não, era só uma cena musical. Os gajos é só música, aquela cena do guitarrista que toca p’ra caralho. E o punk surge de alguma forma para combater essas merdas. Os gajos do trash não, mas os metaleiros clássicos não curtem o punk, acham que é foleiro. Mas, por exemplo, nos concertos de Motornoise há metaleiros e punks, tudo misturado, porque há uma nova vaga que é o metal punk. Às vezes vou na rua e vejo estes putos cheios de brincos e faz-me um bocado de confusão. Preferia vê-los com cristas e cenas a dizerem “Punk’s not dead”. Por outro lado, fico contente porque sinto que ajudei as coisas a tornarem-se mais excêntricas. Durante anos andava na rua de moicano e com 20 brincos e a ser insultado de filho da puta. Acho que também aqui o punk foi importante por ter trazido liberdade.

Mas actualmente não se vêem muitos punks.Não concordo. Vais a um concerto de Motornoise e vês bués moicanos.

Não os vejo na cidade. Por onde andam?São gajos normais durante o dia. Costumo dizer que o estado de espírito para andar de moicano não é todos os dias. É muito fodido, levas com bué bocas. E é exactamente isso que mantém a chama viva. Mas concordo contigo, que já não se vêem tantos moicanos pela rua.

Frágil, à esquerda, com dois amigos numa okupa em St.Pauli, a capital punk alemã na década de 80.

Onde é que paravam na altura?No Luso. Mas éramos muito poucos. O que fazia música experimental, o gajo do teatro, etc. Juntava-se lá tudo, as putas, os paneleiros, músicos, etc. Com o Lá Lá Lá a cena explodiu. Eram centenas de punks que pouco depois deixaram de o ser, passaram a skinheads, rockabillies, psychobillies. Punks ficaram muito poucos.

E a cena okupa do Porto?Também estive metido numa na rua dos Bragas, a única coisa que vi de jeito, tirando a CasaViva. Durou pouco. Não saiu dali grande fornalha de nada. Mas a cena okupa é só um complemento do punk. Nem o punk tem que ser okupa, nem o okupa tem que ser punk.

Claro.Mas até aí se topa a diferença entre os estrangeiros e os portugueses. Quem nos apoiou a sério na okupa da Rua dos Bragas foram os estrangeiros. Dinamarqueses, alemães, belgas, gajos que moravam no Porto e que iam lá, desde professores a arquitectos. Não é uma coisa portuguesa, ao contrário de Espanha. Lá, estive em okupas com sala de ballet para crianças, salas de cinema, tudo e mais alguma coisa. Ou seja, eles sabem que aquele pessoal é fixe, e depois para expulsá-los é complicado. Em Barcelona, que é uma cidade anarquista, deve haver okupas em todas as ruas. Madrid já não, tem zonas específicas de esquerda, Malaseña e outras, onde as okupas se enraizaram muito por causa da guerra civil.


Que outras okupas conheceste pela Europa?Pá, em Hamburgo existe uma zona especial de esquerda, St. Pauli. Tive lá cenas de violência do caralho. Já andam há mais de 20 anos para os tentar sacar de lá.

Que cenas de violência?Para começar, levei logo nas trombas dos carecas quando cheguei à Alemanha, em Frankfurt. Depois é que encontrei um freak, de pé descalço, que me disse para ir para St. Pauli, em Hamburgo, e que lá é que havia punks. Já andava há 15 dias a viajar pela Europa e nada de punks. Em Paris, nenhum. Só skins. Em Frankfurt a mesma merda. Quando cheguei a St. Pauli encontrei as famosas escadas com milhares deles. Nunca tinha visto nada assim. Numa das cenas mais fodidas com a polícia, eu estava lá, chavalo, a dormir. Acordei com berros, olho lá para fora e bué de polícia. Peguei no saco e fugi para a estação de metro. Aí comecei a ver bué de pessoal a ir para o squat. Não percebia nada do que se estava a passar. Acabei por regressar. O bar da cena, digo-to porque vi, tinha um gajo atrás do balcão com grades cheias de garrafas, que eram cocktails molotov. E as miúdas—até tenho uma tatuagem por causa de uma paixoneta por uma delas—tinham batatas com pregos espetados e cordas. Elas atiravam aquilo aos polícias para prender nos capacetes. Quando começaram os confrontos, fugi. Mas fugir é sempre pior, tentas dar a volta para sair e nas ruas estão já os polícias com as portas das carrinhas abertas. É só entrar.

O que é que te fizeram?Nada de especial. Enfiaram-me umas lambaditas. Perguntaram-me o que andava ali a fazer.

Mas a viagem continuou… E durante quanto tempo?Um mês. Fui à Grécia, Alemanha, Dinamarca, Jugoslávia, Bulgária. Tudo isto antes do muro cair. A Grécia era uma cena bué política. Também me marcaram as drogas em Amesterdão. Ir para lá, no início dos anos 80, foi uma sorte do caralho. Levei com junkies, que nunca tinha visto. Só passado uns anos é que apareceram cá.

E mandaste cenas lá?Não, nada. Pá, mandei drogas só aos trinta e tal anos. Aprendi bué de cenas a viajar. Fiz para aí uns sete inter-rails. Mudava as datas, ou as cidades dos bilhetes. Compravas aqui um bilhete no Porto até à fronteira, e depois raspavas o nome e punhas, por exemplo, Londres. Depois vieram os Renegados. Foi a maior maluqueira.

Ya, queria ir para aí. Os Senisga, a tua primeira banda e os famosos Renegados.Não sei quando começou. Senisga foi em Trás-os-Montes. Dois, três concertos. Lembro-me de um, numa festa da Nossa Senhora da Assunção, só com velhotes. Bazou tudo, ou quase tudo. Nós a tocar com distorção. Ficaram 15, mas a curtir tótil. Depois vim para o Porto. Renegados tinha a essência toda do punk, que é como eu costumo dizer, 70% de atitude e 30% de música. Vinhas para a banda porque eras amigo, isso contava mais que tocar. Aquilo tinha os ritmos simples, mas toda a história da banda, toda a envolvência é que a tornava famosa. Quando era suposto começar a decidirmo-nos, tivemos problemas na banda. Egos, gajas, muito álcool. Foi uma banda de sexo, álcool e rock’n’roll. Voltámos, sete ou oito anos depois, com um concerto brutal no Porto Rio.

No Porto havia alguma organização política, alguma estrutura punk?Não. O punk tinha objectivos claros, uma vida melhor, expoente máximo de viver em comunidade. O punk foi a melhor coisa que me aconteceu na vida e também a maior desilusão. Ficaram poucas marcas de uma estrutura em Portugal. Claro que, no aspecto visual, um punk ter andado com 20 brincos fez com que um gajo hoje em dia ande com um e ninguém o chateie. A excentricidade do punk fez com que as pessoas se vestissem de outra forma. Mas no aspecto político, nós nunca fomos organizados. Não é como o movimento skin, que são capazes de se juntar todos e saírem juntos. O punk é uma cena muito mais libertária, não tens que andar comigo para ser punk. Chego aos 44 anos e vejo que fica muito pouco e isso deixa-me desiludido. Com os anos fui-me interessando mais pelo punk político.

O que é o punk político?Há bastante punk político. Um gajo como Jello Biafra enche-me as medidas. Depois há muitas bandas politizadas, com boas ideias. Agora digo que, se soubesse mais na época, teria optado por outras cenas, outras causas. Como ir para África. Não é propriamente uma cena de um punk ir para lá trabalhar com crianças com SIDA.

Soube dessa tua experiência. Como foi isso? Acordaste um dia e disseste “vou para África trabalhar com crianças com SIDA”?Não. Já vinha a pensar nisso há uns anos. Queria ajudar, participar num voluntariado e conhecer África. E não é por isso que sou mais ou menos punk. Aliás, foi à pala do punk, dos concertos, que fui fazer essa merda. E dignifiquei o punk por lá, perante padres, freiras. Foi com essa gente que eu fui.

Falaste com os padres sobre o punk?Falei, claro. E posso garantir-te que uma freira que lá estava me curtiu. Quando regressei, ofereceu-me um cachimbo para fumar ganza.

A freira?Sim, a freira. Fiz lá cenas! Aqueles putos nunca tinham comido carne. Aí vi, também queria ver, que nós vivemos muito bem, comparando com os africanos. Eles não têm vícios, tabaco, álcool. Não há prazer em comer. É só mandioca para matar a fome. Se eu aparecesse com uma banana, os putos pareciam cães atrás da banana. Aquilo bate como o caralho. Ratos por todo o lado. Lá, vai-se mesmo ao fundo da questão. Uma coisa é andares aí a dizer que és contra o sistema, outra coisa é ir à raiz. Filhos da puta. Antes dizia “foda-se o sistema”, mas dizia porque era puto, estava-me a cagar para tudo. Agora digo—mas sei o que digo— que este sistema é uma merda. Numa das músicas dos Renegados dizia que o sistema político tinha falhado, o comunismo falhou, o socialismo democrático também, que o capitalismo era uma merda. Agora sinto mesmo que gosto do que dizia há 15 anos atrás.


Reparem bem no estilo destes gajos. Frágil, ao colo da sua banda punk transmontana, Senisga, num bairro de Moncorvo.

África bateu-te.Nunca mais fui o mesmo. Mudei completamente. A fome, a miséria. Tu lá fodes uma gaja por meio tostão. Aquilo que ouves dizer é mesmo verdade. Vais na rua em Maputo, e as gajas convidam-te para ir para a cama. Gajas normais. É muito mau, muito fodido.

E não fizeste lá um concerto para os miúdos?Não, mas levei discos. Mostrei-lhes música. Imagina, pus Motorhead e os gajos nada, pus Clash e os gajos nada, pus Robert Johnson e os gajos curtiram logo. Eles a curtirem blues, passei-me. Não conheciam, e foi a única coisa que curtiram. Incrível. Foi dali que tudo começou, África. Nunca ouviram blues, e à primeira ficam logo com aquilo.

E que mais fazias por lá?Fazia o que havia para fazer—eletricidade, um poço, tudo com eles. Trabalhei de caralho. Ainda hoje recebo cartas deles. O facto de eu ter sido o gajo mais excêntrico que conheceram, também ajudou à festa.

O regresso foi hardcore?Andei uns tempos a bater mal. Lembrava-me daquilo e só me apetecia regressar. A alegria dos gajos. Às cinco da manhã é futebol por todo o lado, não há cá internets. Bebiam um copo de sumo, com uma água que nem usaria para lavar a roupa. Depois, à noite, comiam aquela massa. Um dia resolvi, sozinho, mexer com aquilo e fiz um banquete para os putos. Comprei uma palete de frangos, que me custou uma pasta do caralho, e lá se fez uma massa. Aquilo estava intragável, mas para eles foi o maior petisco que comeram, só que não lhes tirou a fome. Estão habituados a comer aquelas massas com cabeça de sardinha e tripa, com bué de proteínas. É óbvio que não vens com bom astral de lá.

Interessante.É o que te digo, podes ser punk aos 40 anos. Saber envelhecer é uma virtude.

Mesmo na música…Sim. Já vou menos a concertos. Musicalmente, e talvez por causa da minha idade, já não aceito que as bandas não toquem um caralho. Agora gosto mais de ver boas bandas punk a tocar.

E os Frágil & The Alcoholic Friends?É uma banda de amigos. Mas tenho andado com pouco tempo e disposição para a música. Cansei-me de noites e noites a ensaiar, sem ganhar nada. Essa banda é mesmo só para fins humanitários. Ainda para mais, agora que decidi meter-me nos computadores a programar, fazer vídeos, sites. Estava a precisar de criar cenas novas. Às vezes dou o exemplo de ter ido a Berlim 50 vezes e nunca ter conhecido Berlim. Era só punk-rock, punk-rock. E hoje em dia choco com isso. Havia mais merdas para ver e perdi-as. Agora estou a ajustar as coisas.

Mas os Motornoise ainda rockam.Sim. Poucas bandas fazem o que um gajo faz pela europa fora. Tocamos todos os dias. E é assim que eu curto. Tipo, o Gustavo telefona-me e diz-me que são três semanas de tour e 20 dias de concertos. Agora, tocar sempre no Porto, não. Já conheço o público. Claro que há concertos especiais, quando tocamos com os Ramones, Exploited. Cá em Portugal, estou um bocado farto porque nunca recebes. Ou é porque és punk, ou é porque dizem que estava vazio. Só se perde dinheiro a tocar aqui.

Histórias dessas tours com os Motornoise.Em Marselha temos público como o caralho. Uma vez fomos da Alemanha directos para lá e chegamos às 8 da noite. Comemos uma sande e bota para o concerto. Ainda para mais, era o dia da Tomada da Bastilha. Foi um concerto do caralho. Eu já não bebia tanto por causa dos diabetes, mas subi lá para cima e dei um concertão no meio de cavalões redskins. Houve um que se aproximou—bati com o microfone na minha cabeça e o sangue começou a jorrar-lhe para a cara. Ele até se passou. Ou partes tudo ou comem-te vivo. Também me lembro de tocarmos em Liubliana e o pessoal partir o squat todo, e no fim pôr fogo a tudo.

E a tua queda do primeiro andar do antigo Hard Club?[risos] Como é que sabes dessas merdas?

Andei a investigar-te.Não há nada a contar. Um dia normal como os outros. ‘Tava bêbado, nada mais. Apesar de na altura eu mandar umas cenas, numa fase em que me deu para ir para festas. Mas nesse dia só tinha bebido. Essa queda até me abriu um bocado a cabeça para parar com as drogas.

Abriu e de que maneira.‘Tava cansado, bebi uma garrafa e aquilo bateu-me mal. Só me lembro de estar a falar com um miúdo punk. Desequilibrei-me e caí. Só me lembro de cair. Foi a única vez que senti que ia desta para melhor. Só ouvi “PUM”. Abri a cabeça toda e parti a perna em três sítios. Depois, hospital. Quando lá cheguei disse à médica: “Um punk nunca morre”. E ela a chorar. E ainda a apalpei.

Já não és punk?Epá. Ouvir só punk, não. Sou punk, mas não dessa forma. Fui um gajo que, até meados de 90, só ouvia punk. Estraguei muitos anos da minha vida. Não sei se é bem estragar, mas durante anos e anos só vi a cena punk. Corri o mundo inteiro e era só punk, punk! E há mais coisas para ouvir. O mundo não é só punk, certo? Comecei a abrir os horizontes, musicalmente e intelectualmente.

Portugueses criam cerveja que faz bem à saúde

Portugueses criam cerveja que faz bem à saúde

Portugueses criam cerveja que faz bem à saúde
Dois investigadores da Universidade do Minho (UM) criaram uma cerveja “100% natural e artesanal” que faz bem à saúde. “É um conceito inovador em Portugal, que acreditamos que tem viabilidade”, contaram os doutorandos em soluções para a indústria da experimentação e para a indústria cervejeira à agência Lusa.

De acordo com Francisco Pereira, um dos mentores do projeto, esta cerveja “não é filtrada, ou seja, contém a própria levedura, sendo assim uma fonte de sais minerais, vitaminas e compostos para a regulação do nosso organismo”. Uma vez que não tem químicos nem conservantes, é, no fundo, uma cerveja saudável.

Em breve, o investigador irá abrir, juntamente com o colega Filipe Macieira, um restaurante “muito perto de Braga”. Nesse espaço haverá uma “mini-fábrica de cerveja 100% natural, feita exclusivamente com cereais de produção biológica” para ser servida aos clientes.

Entretanto, Francisco Pereira e Filipe Macieira já inauguraram uma empresa conjunta capaz de produzir cerca de 300 litros de cerveja por mês. A bebida é vendida em garrafas de 0,75 litros, com rolhas de cortiça a três euros e meio cada.

Os tipos de cerveja desenvolvidos até ao momento pelos investigadores são cinco, entre elas a cerveja de trigo, ao estilo alemão, a “belgian ale”, que, com 10% de álcool, é a mais forte e a “pilsner” checa, a mais leve de todas.

A mais bem recebida pelo público tem sido a cerveja de trigo, mas os dois portugueses asseguram que a produção mensal é escoada “em poucos dias”, o que demonstra a “grande aceitação” do produto.

Além de as venderem no seu próprio restaurante, Francisco Pereira e Filipe Macieira esperam também vir a disponibilizá-las no mercado futuramente.

[Notícia sugerida por Vítor Fernandes e Maria Manuela Mendes]